quinta-feira, 10 de abril de 2003

Até quando deixaremos que nossas vidas sejam pautadas pelas novelas da Globo?



As telenovelas exibidas diariamente na Rede Globo são, inegavelmente, um primor de técnica e de competência naquilo a que se propõem: entreter e alienar. Histórias interessantes que prendem a atenção do telespectador e que, de certa forma, fazem-no acreditar que aquilo que lhe é jogado na cara todo dia é um retrato fiel da vida real. As novelas nos mostram que é possível ser feliz e bem-sucedido na vida desde que sigamos rigidamente a receita que nos é imposta por elas. Elas ditam normas de comportamento e padrões de vida que são incutidos em nosso subconsciente e que, sem percebermos, passamos a assumir dogmaticamente como a única forma correta de existência. A pior delas é a novela das oito. Se a nossa vida foge do padrão "noveladasoito", não há a mínima possibilidade de sermos felizes. Tudo deve transcorrer tal e qual o padrão ditado pela Globo.



E as diferenças, como ficam? A vida real nada tem a ver com a ficção novelesca. Ela é infinitamente mais complexa e mais rica em possibilidades de felicidades e, por que não dizer, de infelicidades também. Ou você é daqueles que só considerar-se-á feliz e realizado quando conquistar um bom cargo executivo em uma multinacional, casar com uma pessoa linda e inteligente, ter um casalzinho de filhos para levar todo dia à escola, possuir, no mínimo, dois carros na garagem e uma casa em "Angra" ou "Petrópolis" para descansar nos finais de semana? Se você pensa assim, já está contaminado pelo vírus "noveladasoito".



Agora pense quanta frustração esse padrão "noveladasoito" pode causar em todos nós, pobres mortais da vida real. Porque a vida real é bem diferente. Cheia de adversidades e problemas, repleta de emoções e sentimentos que não caberiam no paupérrimo mundo novelesco-global. A realidade é tão rica em anormalidades que relega a pseudoperfeição das novelas, esta sim, ao posto de anormal. Não é normal um mundo onde tudo é normal demais, onde tudo é certinho demais, tudo dá certo no final e até mesmo o que é pra dar errado não foge à regra, dá errado mesmo. Tudo se encaixa perfeitamente no último capítulo.



E aí vem a comparação: minha vida é tão diferente das novelas, tenho que mudá-la para poder ser feliz. Mas é tão difícil! Como é que na televisão sempre dá certo? Se é possível na novela tem de ser possível também para mim.



Sejamos autênticos e menos hipócritas. Cada um de nós possui a sua maneira particular de ser feliz, de ter prazer, de sentir-se realizado. Não demos ouvidos ao padrão instituído pela sociedade contaminada pelo vírus “noveladasoito”. Perguntemo-nos a nós mesmos se nos sentimos bem sendo o que somos e, caso a resposta seja afirmativa, contrariemos o mundo, mas sejamos fiéis à nossa consciência.

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