sábado, 16 de agosto de 2003

Na minha opinião, ditados populares sempre cumpriram o papel de guarida de néscios. Na hora do aperto, quando a causa está quase perdida sem perspectiva de reversão, bem no meio da fervura do debate acalorado, a luz no fim do túnel surge em forma de aforismo - normalmente sem lastro lógico e coerente, sustentado apenas pela sua repetição insistente ao longo do tempo, o que lhe valeu uma falsa prerrogativa de verdade inquestionável. Sua pronúncia em alto e bom som, em tom de arrogante superioridade, parece encerrar em si mesmo o assunto em questão, garantindo a vitória acachapante a quem dele fez o uso correto, na hora própria. Poucos têm coragem de insurgir-se contra uma máxima bem colocada, mesmo sendo de uma volatilidade absurda tal artifício, pífio e vil; não raro hipócrita e sofista. O erro está em abstrair de uma particularidade casual uma regra universal. É o refúgio dos estúpidos.

Exemplo genial: Chico Buarque, em Bom Conselho, esculacha com o universo proverbial.

Bom Conselho

Ouça um bom conselho
Que lhe dou de graça
Inútil dormir
Que a dor não passa

Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado
Quem espera nunca alcança

Ouça, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar

Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar

Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe

Eu semeio vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade.

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