quarta-feira, 3 de setembro de 2003

No universo novelístico, ao telespectador não é permitido, em hipótese alguma, perguntas do tipo: "por quê?", "mas como?", "de que jeito?", etc. Observações perspicazes, tais como: "todos sabemos que é impossível!", "não há coerência!", "isso é um absurdo!", são inadmissíveis e não podem coexistir com o ato de assistir novelas, sob pena de anulá-las por completo. Se assim o fizermos, cairá por terra a "bendita". No mesmo instante em que algum telespectador mais atento - numa distração da alienação que o escraviza - faz a si mesmo algum desses questionamentos, escancara-se a inverossimilhança da história, a volatilidade do enredo e a pobreza da "dramaturgia". Novelas não foram concebidas com o intuito de nos fazer pensar, mas sim ao contrário: nos anestesiam e nos tornam totalmente insensíveis à realidade nua e crua da vida; nos acalentam sonhos impossíveis para que não tenhamos tempo nem coragem para lutar pelos sonhos possíveis. Entender a incoerência de uma dessas historietas das 8h é tão improvável quanto explicá-las, haja vista que a incoerência possui na sua essência a impossibilidade de entendimento, e que, ao explicarmos o inexplicável, o mesmo se extingue e, conseqüentemente, desfaz-se a novela. Não estrague tudo, seu chato! Não questione as novelas! Assista-as e aceite-as passivamente, elas já fazem parte da sua vida.

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