É, no mínimo, curiosa a coincidência televisiva que se me apresentou ontem à noite, sexta-feira. Mal transpúnhamos as 22h e eu, em frente ao televisor, mecanicamente, troco de canal. A boa e velha TVE levava ao ar o ótimo e insólito Provocações (acesse, aqui, o sítio do programa), programa de entrevistas apresentado pelo grande Antônio Abujamra, o Abu, como é largamente conhecido, figura emblemática do meio artístico e cultural. Sempre ácido e ferino nas suas inteligentíssimas provocações, Abu vem protagonizando, juntamente com seus "provocados" de altíssimo nível - que em alguns momentos viram a mesa, revelando-se maravilhosos provocadores também -, as melhores entrevistas a que assisti nos últimos dez anos. Ponho de lado o controle remoto e degusto mais uma memorável entrevista.
Findo o programa, vou ao controle remoto novamente. Novelinha da Rede Record, a TV do bispo. Tecnicamente, um mal-acabado simulacro dos já famigerados folhetins Globais. Já no alusivo à dramaturgia,... DRAMATURGIA??? (meu deus, devo estar enlouquecendo).
Corta! Retomemos. Vou ao controle remoto, novelinha da Record e, pasmem senhores, lá estava ele: o Abujamra. Foi deveras constrangedor, pra não dizer patético ou coisa pior, ver o grande Abu encarnando um personagenzinho pra lá de co-coadjuvante em uma noveleta da emissora da IURD*. Entendo, todos temos de por o que comer em casa e, certamente, Abu estava ali garimpando uns cobres para o sustento dos seus. Mesmo assim o constrangimento foi catastrófico. Envergonhei-me por mim e por ele junto. Abujamra remete-me inequivocamente ao teatro de alto nível, à literatura, à poesia, etc. Abujamra não rima com novela, que escraviza. Abu é teatro, que emancipa!
Confesso-lhes uma pontinha de decepção, mas compreendo perfeitamente as necessidades humanas, principalmente no Brasil, o propalado país do futebol e do carnaval, onde cultura não dá de comer e a ninguém.
Momento do mea-culpa:
Vai em frente Abu, faz destes esporádicos momentos teledramatúrgicos meros patrocinadores da tua inglória, contudo heróica, missão de divulgar a cultura num país tão tristemente aculturado. Desde que não caias na tentação de virar estrela de contrato exclusivo, bota o dízimo do bispo no bolso e faz dele cultura, que temos fome dela. A cultura, sim, é o verdadeiro milagre, operado, não por Deus, mas pelo povo.
*Igreja Universal do Reino de Deus, o maior embuste religioso de todos os tempos.
3 comentários:
Tua decepção deve ter sido parecida com a minha, ao ver o Carlos "Ratinho" Massa estrelando uma novela do SBT.
Um abraço
AGORA É GREVE!
Máximo
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