domingo, 30 de janeiro de 2005

QUEM AMA O FEIO, BONITO LHE PARECE



Henri Beyle, mais conhecido por seu pseudônimo, Stendhal, autor de, entre outras obras-primas, O Vermelho e o Negro e Do Amor, trouxe-nos passagens das mais sublimes no que tange este sentimento tão experimentado por todos, mas dificilmente explicado a contento: o amor. A pretensão de explicá-lo seria uma ousadia excessiva, mas a sensibilidade deste fenomenal romancista o levou a muito perto disso. Observem estes dois excertos pinçados da obra Do Amor, mais precisamente do capítulo XVII, intitulado "A Beleza Destronada pelo Amor":



"Albéric encontra num palco uma mulher mais bonita que sua amante: permitam-me uma avaliação matemática; digamos uma mulher cujas feições prometem três unidades de felicidade em vez de duas. (Suponhamos que a beleza perfeita dê uma proporção de felicidade traduzível com o número quatro.) Há razão para admirar-se se ele preferir as feições de sua amante que lhe prometem cem unidades de felicidade?"



"Mesmo os pequenos defeitos do rosto, por exemplo, um sinal de varíola, enternecem o homem que ama, lançam-no numa fantasia profunda quando os descobre numa outra mulher. É que na presença daquele sinal de varíola ele viveu mil sentimentos, deliciosos em sua maioria, e todos do maior interesse, sentimentos que se renovam com incrível vivacidade à vista daquele sinal, embora visto no rosto de uma outra mulher."



No primeiro fragmento, uma quase equação matemática, fria e objetiva, mas que traduz com limpidez e transparência absurdas a subjetividade do amor. No segundo, um amor tão imenso que transcende o ser amado, manifestando-se - este mesmo amor por este mesmo ser - noutros objetos de adoração que, em síntese, são um só. Paradoxal? E quem disse que o amor tem lógica?!

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