sábado, 21 de junho de 2008

COITO INTERROMPIDO

Retornando pra casa, de carro.

Ele [entusiasmadíssimo] - Amor, comprei um livro, hoje!
Ela [demonstrando algum interesse] - É? Qual?
Ele [sentido-se estimulado] - É daquele filósofo alemão... como é ainda o nome dele... ah! Schopenhauer! Muito interessante!
Ela [esforçando-se para disfarçar uma certa indiferença] - É mesmo!
Ele [excitadíssimo com a possibilidade de falar sobre o que já lera] - É! O livro* é ótimo! São reflexões acerca do ofício de escrever... como é, ainda, o nome do livro... não estou me recordando... como é, ainda...
Ela [enfastio estampado na face] - Hã...
Ele [não cabendo em si de entusiasmo] - Bom, lembro-me depois. O livro é uma compilação de ensaios (como é, ainda, o nome do livro...) que versam sobre o mundo das letras, os vícios do pensamento humano, as armadilhas da escrita... que merda! Como é, ainda, o nome do livro? Como é ainda...
Ela [impaciente, faz uso do seu cruel e clássico balde de água fria - com limão e gelo!] - Por que tu sempre falas "ainda"?

[silêncio]

Ele [levemente atordoado - a mágoa sempre descansa um pouquinho até doer] - Desculpa...

[silêncio]

Ele aumenta um pouco o volume do CD Player do carro:

"...quem canta comigo
canta o meu refrão
meu melhor amigo
é meu violão..."


*A Arte de Escrever, antologia de ensaios de Arthur Schopenhauer, filósofo alemão.

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