quarta-feira, 10 de abril de 2013

CULTURA INÚTIL?


Recorrentemente, deparo-me com o termo “Cultura Inútil”. Proferem-no cabeças pensantes e não pensantes; mentes conservadoras e libertárias; indivíduos cultos e eruditos, personagens néscios e ignorantes, enquanto eu os escuto e me pergunto:

Cultura tem mesmo de ser útil? Qual seria a utilidade da cultura?

No meu pensar, cultura e utilidade não guardam relação lá muito amigável entre si. Penso em arriscar dizer que cultura, se for útil, sequer é cultura, mas minha pouca ousadia, de momento, não me autoriza tal decreto. Sigamos, então, na linha de que cultura apenas não necessita ser útil.

Ora, cultura não precisa ser uma ferramenta ou um instrumento, tampouco produzir resultados, pois, para tanto, temos a figura do conhecimento, cujo objetivo é o de produzir algo, criar, modificar, promover evolução e aperfeiçoamento (...enriquecer o capitalista, locupletar o corrupto, concentrar renda, gerar mais-valia... ops! Mas essa já outra história!). O conhecimento, este sim, pode ser qualificado como útil ou inútil, a cultura, jamais. Ela estará sempre léguas acima destes enquadramentos.

A cultura, na acepção aqui proposta, sinto-a muito mais próxima da sabedoria do que do conhecimento. Numa visão um tanto poética, percebo a cultura “dentro de nós”, e o conhecimento “fora de nós”. É bem complicado me fazer entender, pois esse sentimento é-me muito íntimo e essencialmente empírico. A cultura me completa, alimenta-me a alma, transforma-me e, se me permitem, torna-me feliz; então, novamente pergunto: qual a utilidade de tudo isso? O que pode haver de útil, de proveitoso, de lucrativo em ser feliz, em sentir-se completo e de alma transformada? Absolutamente nada! A cultura, sob as formas de arte, costumes, valores, não produz nada de concreto, é formidavelmente inútil. É algo belo – ou não tão belo – com o que nos comprazemos, deleitamo-nos; é algo que diz precisamente quem somos, porque e como; aponta caminhos e também os constrói; oxigena a vida.

Em tempo, lembrei-me de outra questão relevante: a cultura nunca será útil nem inútil, contudo, pode-se, eventualmente, qualificá-la de fútil, não por antonímia do útil, mas por ter valor cultural questionável, pueril, superficial. Observem que a erroneamente difundida “cultura útil” (quando se fala em “cultura inútil”, pressupomos que em seu socorro deva existir uma “cultura útil”, o que produz essa falsa dicotomia) é tão intrinsecamente contraditória quanto o “conhecimento inútil”. A cultura é um ente de natureza maravilhosamente inútil, enquanto o conhecimento traz a utilidade, a proficuidade, na sua essência. O conhecimento confere poder; a cultura faz transcender.

Tomei coragem: cultura, se for útil, não é cultura; conhecimento, se for inútil, não é conhecimento. Decretei. Fica o dito pelo não dito. Encontro-me, a partir de já, receptivo às pedras.

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